Mais Estranho que a Ficção (2006)
"Não há nada melhor do que uma combinação de boas idéias com boas piadas." A declaração da atriz Emma Thompson, que interpreta a escritora Karen Eiffel no filme "Mais Estranho que a Ficção" (Stranger than Fiction, 2006) dá bem a dimensão do que o filme de fato é.
Não se trata de um filme arrebatador nem de uma projeto absolutamente novo. Outros filmes trataram de uma história dentro de outra e de um enredo onde personagens da realidade e da ficção se trombam, permitindo um questionamento de um mundo e de outro.
Enquanto assitia ao filme, eu pensava que se trata de uma história para as platéias, mas é também um experimento com alguma ousadia. Nem tanto pesado ou alternativo, nem tanto previsível. É uma comédia que usa de uma boa idéia, uma boa "sacada" alguém dirá, e que luta para dar um desfecho à altura dessa boa idéia que a gerou.
E vamos admitir que a idéia em que este filme se baseia é fabulosa, porque simples e original, e entretanto o desfecho não chega tão alto (embora também não chegue a se configurar numa decepção).
A trama é a seguinte. Harold Crick (Will Ferrell) é um funcionário da Secretaria de Fazenda, um fiscal do imposto de renda, que tem uma vida banal e absolutamente cronometrada.
Ele conta a quantidade exata de vezes que escova cada dente, tem horário certo para o café, e segue a sua vida solitária sem ambições. Até o belo dia em que ouve claramente uma voz narrando todos os acontecimentos de sua vida, incluindo o que vai no seu pensamento.
Em outro ponto da cidade está a dona da voz, a escritora Karen Eiffel, conhecida por sempre matar o seu herói no final do livro. A questão é que desta vez o herói é Harold, uma pessoa de carne e osso, que ouvindo essa narradora toma conhecimento de que sua morte é iminente.
É claro que ele vai tentar fazer o possível para evitar a morte e aí sua vida dá uma guinada. "O que você seria capaz de fazer se soubesse que sua morte está próxima" - este é um dos pilares do filme, embora secundário. E a partir daí, a vida de Harold vira de ponta cabeça.
No percurso, ele conhece o professor de literatura Jules Hilbert (Dustin Hoffman) que o convence de que ele deve mudar a vida para que o seu livro se torne uma comédia - quando ao invés de morrer no final, ele se casa e é feliz para sempre.
Embora Will Ferrell seja um reconhecido comediante, o humor aqui fica mais reservado ao personagem de Hoffman ou às próprias situações um tanto vexatórias em que o fiscal do imposto se mete para tentar conquistar o coração de uma radical (mas tenra) dona de uma confeitaria, a Ana Pascal (Maggie Gyllenhaal).
Há quem tenha nomeado o filme de tragicomédia para citar termos usados no próprio filme, em uma cena em especial. E o filme, embora se incline para o lado da comédia, apresenta um drama humano de um cara simples, cujo único desejo é evitar sua morte que parece cada vez mais próxima. Um encontro entre criador e criatura, personagem e autora é inevitável. E a forma como isso acontece é um dos momentos mais inspirados e interessantes do longa.
A narrativa é linear e crescente, aumentando a tensão enquanto nos faz imaginar de que maneira a autora vai assassinar seu herói. E se vendo com bloqueio criativo, a escritora sai à rua com uma assistente imposta pela sua editora (Queen Latifah) à busca de inspiração (afinal, o livro tem prazo).
A melhor coisa do filme é o personagem que nos dá Will Ferrell. Propositadamente banal e comum, Harold é o mais tridimensional dos personagens em cena e o que mais fácil conquista as simpatias do público, embora seja burocrático e correto de dar nos nervos.
A doceira Ana Pascal que faz o seu par romântico, vivida por Gyllenhaal, proporciona momentos bem bonitos ao lado de Ferrell. O interesse pela doceira é um dos pontos de distensão em relação ao drama da morte iminente e quase o ofusca.
E há outros tantos desses momentos que à mesma hora que distensionam o tema principal, permitem as condições para que ele sempre volte ao centro. As conversas entre o professor e Harold são alguns desses momentos.
Não há como não rir neste filme, mesmo diante das situações mais dramáticas. Aliás, o roteiro é feito para que assim seja. E temos a sensação de leveza, comédia leve e inteligente, o tempo todo. A montagem é rápida e embora tenha lido alguns críticos reclamando do ritmo, tudo flue sem problemas.
As imagens antecipadas do garoto e sua mãe que só vão ter de fato uma função no desfecho, parecem desnecessárias. Como parece desnecessária a cena do trator que demole parte do apartamento de Harold "por engano".
Ficamos sabendo que o objetivo foi mostrar que Harold não controla seu destino. Certamente, há formas menos "fantásticas" de se fazer isso. A cena parece uma escapulida do percurso clean e sem enfeites em que o filme vinha caminhando.
Por fim, é um longa-metragem com qualidades acima da média cujo maior mérito é se apoiar em uma boa idéia e conseguir desenvolvê-la, mantendo o bom nível.
Título original: Stranger than Fiction/ Direção: Marc Foster/ Roteiro: Zach Helm/ Elenco: Will Ferrell, Emma Thompson, Maggie Gyllenhaal, Dustin Hoffman, Queen Latifah.
Não se trata de um filme arrebatador nem de uma projeto absolutamente novo. Outros filmes trataram de uma história dentro de outra e de um enredo onde personagens da realidade e da ficção se trombam, permitindo um questionamento de um mundo e de outro.
Enquanto assitia ao filme, eu pensava que se trata de uma história para as platéias, mas é também um experimento com alguma ousadia. Nem tanto pesado ou alternativo, nem tanto previsível. É uma comédia que usa de uma boa idéia, uma boa "sacada" alguém dirá, e que luta para dar um desfecho à altura dessa boa idéia que a gerou.
E vamos admitir que a idéia em que este filme se baseia é fabulosa, porque simples e original, e entretanto o desfecho não chega tão alto (embora também não chegue a se configurar numa decepção).
A trama é a seguinte. Harold Crick (Will Ferrell) é um funcionário da Secretaria de Fazenda, um fiscal do imposto de renda, que tem uma vida banal e absolutamente cronometrada.
Ele conta a quantidade exata de vezes que escova cada dente, tem horário certo para o café, e segue a sua vida solitária sem ambições. Até o belo dia em que ouve claramente uma voz narrando todos os acontecimentos de sua vida, incluindo o que vai no seu pensamento.
Em outro ponto da cidade está a dona da voz, a escritora Karen Eiffel, conhecida por sempre matar o seu herói no final do livro. A questão é que desta vez o herói é Harold, uma pessoa de carne e osso, que ouvindo essa narradora toma conhecimento de que sua morte é iminente.
É claro que ele vai tentar fazer o possível para evitar a morte e aí sua vida dá uma guinada. "O que você seria capaz de fazer se soubesse que sua morte está próxima" - este é um dos pilares do filme, embora secundário. E a partir daí, a vida de Harold vira de ponta cabeça.
No percurso, ele conhece o professor de literatura Jules Hilbert (Dustin Hoffman) que o convence de que ele deve mudar a vida para que o seu livro se torne uma comédia - quando ao invés de morrer no final, ele se casa e é feliz para sempre.
Embora Will Ferrell seja um reconhecido comediante, o humor aqui fica mais reservado ao personagem de Hoffman ou às próprias situações um tanto vexatórias em que o fiscal do imposto se mete para tentar conquistar o coração de uma radical (mas tenra) dona de uma confeitaria, a Ana Pascal (Maggie Gyllenhaal).
Há quem tenha nomeado o filme de tragicomédia para citar termos usados no próprio filme, em uma cena em especial. E o filme, embora se incline para o lado da comédia, apresenta um drama humano de um cara simples, cujo único desejo é evitar sua morte que parece cada vez mais próxima. Um encontro entre criador e criatura, personagem e autora é inevitável. E a forma como isso acontece é um dos momentos mais inspirados e interessantes do longa.
A narrativa é linear e crescente, aumentando a tensão enquanto nos faz imaginar de que maneira a autora vai assassinar seu herói. E se vendo com bloqueio criativo, a escritora sai à rua com uma assistente imposta pela sua editora (Queen Latifah) à busca de inspiração (afinal, o livro tem prazo).
A melhor coisa do filme é o personagem que nos dá Will Ferrell. Propositadamente banal e comum, Harold é o mais tridimensional dos personagens em cena e o que mais fácil conquista as simpatias do público, embora seja burocrático e correto de dar nos nervos.
A doceira Ana Pascal que faz o seu par romântico, vivida por Gyllenhaal, proporciona momentos bem bonitos ao lado de Ferrell. O interesse pela doceira é um dos pontos de distensão em relação ao drama da morte iminente e quase o ofusca.
E há outros tantos desses momentos que à mesma hora que distensionam o tema principal, permitem as condições para que ele sempre volte ao centro. As conversas entre o professor e Harold são alguns desses momentos.
Não há como não rir neste filme, mesmo diante das situações mais dramáticas. Aliás, o roteiro é feito para que assim seja. E temos a sensação de leveza, comédia leve e inteligente, o tempo todo. A montagem é rápida e embora tenha lido alguns críticos reclamando do ritmo, tudo flue sem problemas.
As imagens antecipadas do garoto e sua mãe que só vão ter de fato uma função no desfecho, parecem desnecessárias. Como parece desnecessária a cena do trator que demole parte do apartamento de Harold "por engano".
Ficamos sabendo que o objetivo foi mostrar que Harold não controla seu destino. Certamente, há formas menos "fantásticas" de se fazer isso. A cena parece uma escapulida do percurso clean e sem enfeites em que o filme vinha caminhando.
Por fim, é um longa-metragem com qualidades acima da média cujo maior mérito é se apoiar em uma boa idéia e conseguir desenvolvê-la, mantendo o bom nível.
Título original: Stranger than Fiction/ Direção: Marc Foster/ Roteiro: Zach Helm/ Elenco: Will Ferrell, Emma Thompson, Maggie Gyllenhaal, Dustin Hoffman, Queen Latifah.
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